Armários

Um candidato à presidência associa a homossexualidade à pedofilia, diz que é preciso “enfrentar essa minoria” . Quando perguntam se ele é homofóbico, a resposta é “homofóbico, eu? Imagina, só coloquei a situação da maneira correta”.

Um pai de família faz piadas com gays, ri de travestis na rua e “não gostaria de ter um filho gay”. Quando perguntam se ele é homofóbico, a resposta é “homofóbico, eu? Imagina, eu nunca agredi nem nunca vou bater em um gay”.

Um ator famoso é conhecido por sair com homens e por gostar de outros homens. Quando perguntam se ele é gay, a resposta é “gay, eu? Imagina, com quem eu saio não tem nada a ver com vocês”.

Um jogador de futebol chama o namorado de primo na frente dos outros e pede para uma amiga dar um selinho para “ser flagrado com uma loira”. Quando perguntam se é gay, a resposta é “gay, eu? Imagina, gosto mesmo é de mulher”.

Uma garota chama um jogador de macaco no meio de um jogo de futebol, repetidas vezes. Quando perguntam se é racista, a resposta – em prantos – é “racista, eu? Imagina, não tive a intenção racista. Foi no calor do jogo”.

Um autor branco escreve uma série sobre garotas “da favela” com título controverso sobre mulheres negras. Quando perguntam se é racista, a resposta – furiosa – é  “racista, eu? Imagina. É uma obra de ficção, vocês que estão sendo preconceituosos”.

Um homem conta – e ri – de piadas de loira, chama a chefe/esposa de ‘mal comida’ e diz que mulher feia deve agradecer quando é estuprada. Quando perguntam se é machista, a resposta é “machista, eu? Imagina, era só uma brincadeira”.

Uma mulher julga outra pelo tamanho do corpo, quantidade de homens que transou; fala que não deve nada ao feminismo. Quando é perguntada se é machista, a resposta é: “machista, eu? Imagina, sou humanista”.

Uma mulher acredita na igualdade de oportunidades, quer que mulheres e homens tenham salários iguais, odeia ser cantada na rua. Quando perguntam se é feminista, a resposta é “feminista, eu? Imagina, sou feminina, não feminista”.

Um médico olha para a paciente, não a examina, não pergunta qual é o problema de saúde que ela tem e já lhe dá uma dieta como receita. Quando perguntam se é gordofóbico,  a resposta é “gordofóbico, eu? Imagina, estou falando apenas pela sua saúde”.

Um senhor votou no 45/13 nas últimas 3 eleições presidenciais e governamentais. Quando perguntam se é tucano/petista, a resposta – indignada – é “tucano/petista, eu? Imagina, sou apartidário“.

 

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O Brasil é um país que precisa sair do armário. Urgentemente.

O fascismo (também) saiu do Facebook

Partidos sitiados no manifesto desta quinta-feira, 20 (Foto: Mídia NINJA)

Partidos sitiados no manifesto desta quinta-feira, 20 (Foto: Mídia NINJA)

Amigos, a massa desandou, o caldeirão transbordou e o caldo entornou. As manifestações contra o aumento das tarifas de ônibus, que começaram com fogo e bombas de gás lacrimogênio no meio da Paulista há duas semanas, estão rumando para acabar de maneira muito mais violenta. Só que uma violência psicológica. E, não, não tem nada a ver com a PM (e nem com os R$ 0,20), antes tivesse.

Exatamente uma semana depois da PM ter barbarizado os manifestantes pela região da Consolação, as pessoas voltaram às ruas para, dessa vez, comemorar a revogação das tarifas.  Numa mistura de hino nacional, bandeiras, caras pintadas de verde e amarelo, apitos, fogos de artíficio (sim, para que? eu não sei muito bem), a “passeata” ocorreu de maneira estranha. Diferente até mesmo das passeatas maiores que haviam ocorrido na segunda e na terça-feira. A pauta do transporte foi esquecida e deu lugar a outras, muitas outras, e assustadoras outras.

Antes de ir até a Paulista  já tive alguma ideia de como a carruagem estava andando nessa passeata. Soube de hostilização a militantes partidários, escutei da sala da redação em que trabalho – que fica na Brigadeiro – vaias que eram voltadas a representantes do PT. Forçaram os partidos a saírem do movimento. Previamente, isso já não me deu vontade alguma de participar disso. Mas, como trabalho por ali, fui forçada a ir para a Paulista para pegar um metrô para casa. O clima era de final de copa do mundo. Muitas pessoas, crianças. Poderia ser bonito, juro, mas estava assustador. Vi de longe uma pessoa carregando uma bandeira, enorme, cujos dizeres mostravam “contra a corrupção”. Sim, dessa forma. Não há maneira menos política de se fazer um manifesto do que bradar contra a corrupção, uma coisa difusa da qual ninguém se diz abertamente a favor, logo, ser contra não é lá algo a se pleitear. Outros, muitos, cartazes tinham dizeres contra Dilma (o que ela fez de errado, na constituição, pra merecer um impeachment? eu não sei muito bem), contra o Lula ( se o Superior Tribunal de Justiça, nossa mais alta instituição da Justiça não achou nada para incriminar ele, por que as pessoas das ruas o querem na cadeia? eu não sei muito bem), contra a Copa (que motivo faz as pessoas a querer parar um evento que já gastou tanto para ser feito um ano antes? eu não sei muito bem).

Tudo isso me deixou nauseada. Liguei para um amigo, relatei o acontecido, desacreditada de que, em apenas sete dias, tudo tinha saído tanto do lugar, que nem parecia o mesmo movimento. Desliguei o telefone, então escutei uma coisa que me chamou atenção. Um garoto com um suéter – tipo cardigã sem botão – vermelho vivo estava na calçada gritando com dois grandalhões, carecas, do outro lado da calçada. “Como vocês tiveram coragem de bater em idosos? Pessoas que lutaram na ditadura?”, gritava o garoto, indignado. Do outro lado da calçada, o perto da rua, um dos grandalhões, de camisa roxa, gritava de volta, enquanto avançava no menino. “Seu petista de merda. Comunista. Vai dar o cu para o PT”, gritou. Vejam bem, o menino estava usando um cardigã vermelho, sem estrelas, sem nada. No que escutei isso, fiquei irritada com dois pontos, esse anti-petismo e a homofobia. E gritei também para os grandalhões “isso é democracia. todo mundo junto. partido também é democracia”. O grandalhão de roxo ficou bravo e, se não fosse pelas pessoas que passavam “”””””alheias”””””” a isso, ele teria chegado ainda mais perto de mim. Avançou muito, me chamou de “vadia petista” (por que insistem em chamar mulher de vadia sempre? eu não sei muito bem), falou umas outras impropriedades. Foi puxado pelo amigo, enquanto eu, que continuava gritando “é democracia, é democracia”, fui puxada pelas pessoas do lado da calçada.

O garoto de vermelho, Andrei, comentou comigo que havia sido hostilizado por esses dois brutamontes por estar usando vermelho. Inconformada com o rumo de tudo, não só desse acontecimento pontual, comecei a conversar com ele e com outras, POUCAS pessoas que estavam contra aquela micareta pseudoengajada em que estávamos. “Me doeu menos sentir o gás lacrimogenio e fugir da PM semana passada do que ver o que tudo se tornou”, falou ele para mim. Não pude deixar de concordar, principalmente com as informações que fui recebendo depois. Um menino chamado Gabriel chegou, com a camisa rasgada. Na camisa os dizeres “sem violência, movimento passe livre”. Ele contou para nós o que aconteceu com os militantes de partidos na passeata: violência e hostilidades abertas. Militantes idosos, de 70 anos, 80 anos, do PC, haviam sido ameaçados. Pessoas gritavam e vaiavam, e ele, no alto dos seus 16 anos, ajudou algumas pessoas a fazer uma corda humana para proteger os militantes, que foram obrigados a se retirar. Enquanto isso, a PM não fazia nada. “A PM mudou de farda, agora está usando a bandeira do Brasil”, foi de Andrei a melhor (porém não mais animadora) frase da noite.

Percebi que as pessoas “de esquerda”, ou que se diziam minimamente partidárias (ou que votam em partidos de esquerda, imagino que muitos psdbistas estavam ali, quebrando bandeiras, mas divago) estavam à margem da manifestação. Um grupo da CUT passou na nossa frente, pareciam acuados e temerosos. Um deles olhava para trás, incessantemente, como se fosse perseguido e mantinha as mãos fixas no braço de uma das garotas, que estava atrás dele. As pessoas do meio da rua estavam alheias a isso. Presas no torpor nacionalista, nas bandeiras e no verde e amarelo. E a estranheza, que tanto tinha questionado ao ler esse texto, bateu direto na minha cabeça e no meu estômago. Os PMS apenas observavam os passantes. Discussões “políticas” podiam ser escutadas em quase toda parte, mas numa superficialidade que beira a ingenuidade.

Junto com a insatisfação irrestrita, a falta de conhecimento pode ser mais do que explosiva, como eu pude testemunhar nessa noite, na Paulista. Pessoas carregavam cartazes contra os “políticos”, como se estes fossem uma entidade sem rosto, nome ou sigla e apenas com uma conta bancária, ou melhor, um saco de dinheiro, uma camisa listrada preta e branca e uma máscara. Não, nem todos os políticos são ladrões e corruptos. O que me assustou (e muito) nesta “passeata” foi a total falta de conhecimento político das pessoas que estavam lá com a certeza de que estavam “mudando o Brasil”. Amigos, para mudar algo é necessário que você, no mínimo, entendam a estrutura desse algo. E, pelo que vi das reações, poucos ali entendiam a estrutura da nossa democracia.

Não entender o funcionamento de uma democracia, rechaçar esse sistema, hostilizar quem pensa diferente e banir partidos não tem cara de gigante acordando para mim. Tem cara é de ditadura acordando. É, amigos, aparentemente ‘a juventude’ saiu do Facebook, o fascismo e as incongruências presentes em fóruns e caixas de comentários de portais/blogs também.

[PS: A quem me acha de extrema esquerda ou vermelinha, bem, sinto-lhes informar, sou centro esquerda. E olhe lá.Ah, se você não sabe o que é centro esquerda, favor, veja aqui]